Casa dos políticos aposentados

62% dos 238 conselheiros de tribunais de contas no País conquistaram os cargos depois de exercer mandatos políticos ou posições em governo federal ou estadual

Estudo da Transparência Brasil, entidade cuja principal bandeira é o combate à corrupção, revela que 62% dos 238 conselheiros de tribunais de contas no País conquistaram os cargos depois de exercer mandatos políticos ou posições em governos. Segundo o relatório, os tribunais são caros, altamente politizados e “desenhados para não funcionar”.

Além dos 62% de ex-políticos, cerca de 15% dos integrantes dos tribunais são parentes de algum político local – o que coloca em questão sua independência para atuar como fiscais da administração pública. Esse cenário vale tanto para as cortes estaduais quanto para o Tribunal de Contas da União, como mostrou recentemente o episódio envolvendo o senador Gim Argello (PTB/DF), preterido pelo Senado para o TCU por responder a processos no STF.

Nos tribunais de contas pelo País, dois terços dos integrantes são nomeados pelo Legislativo e um terço pelo Executivo. “Eles costumam ser indicados justamente para neutralizar o papel fiscalizador desses órgãos – e, de quebra, para agradar a correligionários, parentes e aliados”, diz o relatório elaborado por Natália Paiva e Juliana Sakai.

O estudo detectou que dois em cada cinco conselheiros sofrem processos ou foram condenados na Justiça ou nos próprios tribunais de contas – até por improbidade administrativa e peculato.

Segundo o relatório, as exigências previstas na Constituição são frouxas. As exigências se restringem a aspectos formais – ter entre 35 e 70 anos de idade e uma década de experiência profissional correlata – e a questões subjetivas, como “idoneidade moral”, “reputação ilibada” e “notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública”.

Na prática, os critérios técnicos ficam em segundo plano. “A indicação política é a regra na escolha de conselheiros, o que faz com que as votações nas Assembleias, nas Câmaras e no Congresso sejam jogos de cartas marcadas”, diz o estudo.

Os cargos são cobiçados por políticos em fim de carreira, entre outros pontos, por garantir uma aposentadoria confortável. “Em geral, o salário é de R$ 26.500, além de gratificações, verbas de gabinete uniformemente obscuras, prerrogativa de nomear funcionários comissionados e vitaliciedade no cargo (com aposentadoria compulsória aos 70 anos).”

CONTAS CARAS

Os tribunais, que são órgãos auxiliares do Poder Legislativo, têm uma estrutura tão cara que, em muitos casos, acabam custando aos cofres públicos quase tanto quanto as Assembleias Legislativas.

No Rio, o orçamento da Assembleia é de R$ 682 milhões, enquanto o do TCE chega a R$ 593 milhões. Em outras cinco unidades da Federação (Amazonas, Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul e Pernambuco), os gastos dos tribunais de contas equivalem a 70% ou mais do total consumido pelas Assembleias.

Mesmo quando as cortes exercem poder fiscalizador, raramente as punições se concretizam. “Como os TCs não fazem parte do Poder Judiciário, o julgamento das contas segue o formato de um tribunal administrativo, o que provoca impacto sobre a validade de suas decisões.”

No caso do TCU, “a relação entre multas aplicadas e pagas é baixíssima: 4,6% entre 2005 e 2009 e 8,3% entre 2008 e 2010, segundo dados do próprio tribunal”. “Pode-se inferir que nos TCEs e TCMs a efetividade tende a ser ainda mais baixa. O que leva ao questionamento natural sobre se o dinheiro público investido na manutenção dessas cortes fortemente politizadas tem o retorno esperado.”

TCU: SEIS POLÍTICOS

Dos nove ministros do Tribunal de Contas da União, seis são políticos indicados pelo Congresso Nacional: João Augusto Nardes, ex-deputado federal do PP-RS, indicado pela Câmara dos Deputados em 2004, na disputa em que derrotou o então deputado federal José Pimentel do PT-CE; Antônio Valmir Campelo Bezerra, ex-deputado federal e senador, ligado a Joaquim Roriz, foi indicado pelo Senado em 1997; Aroldo Cedraz, deputado federal historicamente ligado ao ex-senador Antonio Carlos Magalhães, foi indicado pela Câmara dos Deputados, na disputa em que derrotou o deputado federal Paulo Delgado do PT-MG, no ano de 2006; José Jorge, ex-deputado federal e senador, historicamente ligado ao PDS e ao PFL, foi candidato a vice-presidente de Geraldo Alckmin do PSDB na eleição de 2006, foi indicado pelo Senado em 2008; José Múcio Monteiro, ex-deputado federal do PTB, indicado por Lula em 2009; Ana Arraes, deputada federal do PSB-PE, foi indicada pela Câmara dos Deputados em 2011, após vencer a disputa contra o deputado federal Aldo Rebelo do PCdoB-SP.

São consideradas escolhas técnicas: Benjamin Zymler, servidor de carreira do TCU, indicado por FHC; Walton Alencar Rodrigues, servidor de carreira do Ministério Público, foi indicado pelo Ministério Público e aprovado o seu ingresso no TCU em 1999; e Raimundo Carreiro, servidor de carreira do Senado, indicado por unanimidade pelo Senado no ano de 2007.

O ex-senador goiano Iram Saraiva também exerceu o cargo de ministro do TCU, por indicação política, à época filiado ao PMDB. Ocupou a presidência da Corte. Hoje está aposentado.

Saiba Mais

Associação critica estudo sobre tribunais de contas

A Associação Nacional dos membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) criticou, por meio de nota, relatório formulado pela Transparência Brasil, entidade cuja principal bandeira é o combate à corrupção. O estudo revelou que 62% dos 238 conselheiros de tribunais de contas conquistaram os cargos depois de exercer mandatos políticos ou posições em governos. De acordo com o relatório, os tribunais são caros, altamente politizados e “desenhados para não funcionar”.

A Atricon rebateu dizendo que o relatório “é falho, superficial e irresponsável” e que a Transparência Brasil fez vistas grossas em relação à evolução dos tribunais de contas nos últimos anos. “Os indicadores de benefícios financeiros refletem os recursos economizados para o erário a partir de uma atuação em tempo real e preventiva dos tribunais de contas, especialmente em relação aos procedimentos cautelares em licitações e contratos. É inegável a contribuição dos órgãos para o aperfeiçoamento democrático a partir do envio à Justiça eleitoral de lista com os nomes daqueles gestores que tiveram contas julgadas irregulares, os quais, cada vez mais, tornam-se inelegíveis”, consta da nota.

Conforme o estudo, além dos 62% de ex-políticos, cerca de 15% dos integrantes dos tribunais são parentes de algum político local – o que coloca em questão sua independência para atuar como fiscais da administração pública. O cenário descrito vale para as cortes estaduais e também para o Tribunal de Contas da União (TCU). “A afirmação de que todas as indicações de cidadãos oriundos da classe política ou da administração pública são feitas para neutralizar a atividade do controle é desdenhosa, preconceituosa e imatura, sem comprovação”, diz a Atricon.

Na nota, o presidente da Atricon, Valdecir Pascoal, afirmou que “a Transparência Brasil ignorou o direito da presunção de inocência listando pessoas públicas que respondem a procedimentos ainda pendentes de julgamento, passando a ideia de que inquéritos e processos sejam privilégios de membros dos tribunais de contas”.

O relatório apontou ainda que os tribunais, que são órgãos auxiliares do poder Legislativo, têm uma estrutura tão cara que, em muitos casos, acabam custando aos cofres públicos quase tanto quanto as assembleias legislativas. “O estudo comparou – ilogicamente e com má-fé – o custo dos membros de tribunais de contas e o custo dos parlamentares. São instituições naturalmente diferentes, embora ambas atuem na fiscalização do estado”, concluiu Pascoal.

Em Goiás, TCE e TCM são ocupados por ex-deputados

Dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE), cinco ocupam os cargos por indicações políticas, ora pelo Executivo ora pelo Legislativo.

O presidente Edson Ferrari ocupou o cargo de secretário particular do governador Marconi Perillo (PSDB). Foi indicado pelo Executivo e referendado pelo Legislativo. Ferrari é formado em Jornalismo e Direito.

Carla Santillo, ex-deputada estadual pelo PSDB e filha do ex-governador Henrique Santillo, já falecido. Também foi indicada pelo governador Marconi Perillo. É a atual vice-presidente da Corte.

Kennedy Trindade, corregedor-geral do Tribunal, foi deputado estadual, pelo PMDB, e teve indicação da Assembleia Legislativa. Já foi, também, presidente do extinto Crisa, autarquia que cuidava da recuperação das rodovias no governo Iris Rezende.

Milton Alves foi vice-prefeito de Anápolis (gestão Henrique Santillo e deputado estadual pelo PMDB. Exerceu a presidência da Assembleia Legislativa. Foi indicado para o cargo pelo governador Henrique Santillo.

Sebastião Tejota foi deputado estadual. Exerceu a presidência da Assembleia Legislativa. Foi indicado pelo governador Marconi Perillo.

Celmar Rech foi indicado conselheiro na vaga de auditor pelo atual governador, Marconi Perillo.

Saulo Marques Mesquita é funcionário de carreira da Corte, sendo indicado na vaga de procurador pelo governador Marconi Perillo.

Os ex-deputados Enio Paschoal, Eurico Barbosa, José Sebba e Anísio de Sousa, já aposentados, também exerceram o cargo de conselheiro do TCE por indicações políticas. O ex-deputado estadual Waldir Castro Quinta (in memoriam) também foi conselheiro e presidente. Os ex-governadores Naphtali Alves e Henrique Santillo (in memoriam) ocuparam o cargo de conselheiro, inclusive a presidência do TCE.

TCM

Dos sete conselheiros do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), cinco chegaram aos cargos por indicações políticas.

O presidente Honor Cruvinel foi deputado estadual pelo PSDB. Chegou ao cargo por indicação da Assembleia Legislativa.

Virmondes Cruvinel foi deputado estadual e federal pelo PMDB e exerceu cargos nos governos estaduais de Henrique Santillo, Iris Rezende e Maguito Vilela.

Sebastião Monteiro Filho, conhecido como Sebastião Caroço, foi prefeito de Formosa por dois mandatos, e deputado estadual. Chegou ao tribunal por indicação do governador Marconi Perillo.

Nilo Resende Neto foi deputado estadual pelo DEM e ocupou secretaria extraordinária no governo Marconi. É da cota da Assembleia Legislativa.

Daniel Goulart foi deputado estadual, presidente do antigo Cerne (hoje Agecom) e secretário de Relações Institucionais do governo Marconi. Foi indicado pelo Executivo.

Os ex-deputados Agenor Rezende, Jossivani de Oliveira, Walter Rodrigues (já aposentados) e Sodino Vieira (in memoriam), e o ex-secretário particular do então governador Iris Rezende, Paulo Ortegal (aposentado), também foram indicados ao cargo de conselheiro pela via política.

Chegaram ao cargo de conselheiro do TCM pelas cotas técnicas: Francisco José Ramos e Maria Teresa Garrido Santos.

Fonte: Diário da Manhã